quinta-feira, 10 de junho de 2021

Uma incógnita chamada Cruzeiro

Mozart é mais uma aposta. Entretanto as alternativas que há também são, embora uns tenham maior probabilidade de darem certo do que outros

Mozart Santos é o novo treinador do Cruzeiro. Depois de demitir Felipe Conceição na mesma noite em que aconteceu a derrota e eliminação para o Juazeirense, nos pênaltis, pela Copa do Brasil, o clube foi imediatamente ao mercado atrás de outros nomes. Na verdade, como revela o GE, antes do jogo contra o time baiano, Sérgio Rodrigues e sua trupe já monitoravam o técnico de 41 anos. Nos bastidores consideravam de antemão a possibilidade do vexame na competição nacional (o que se concretizou) e por isso cogitavam a substituição de "Tigrão".

O melhor trabalho de Mozart foi a arrancada do CSA na Série B 2020: o time saiu da zona de rebaixamento e brigou pelo acesso até o fim, terminando o campeonato em quinto lugar, a 3 pontos da vaga na Série A. Depois ele aceitou treinar a Chapecoense, não repetindo o bom desempenho que teve no desafio anterior. Foi demitido em pouco mais de 40 dias. 

Mozart é mais uma aposta. Entretanto as alternativas que há também são, embora uns tenham maior probabilidade de darem certo do que outros. O Brasil sofre com pobreza tática. Alguns grandes clubes brasileiros estão indo buscar treinador em outros países. Outros pegam os melhores daqui mesmo. Sobram as incógnitas. E não se trata apenas de novatos. Até os veteranos tornam-se apostas no time celeste. O clube sofre com problemas proporcionais ao seu gigantesco tamanho. Aceitar o desafio de reerguê-lo implica em trabalho hercúleo; em tentar fugir de um campo minado complexo. Enderson Moreira e Ney Franco haviam sido bem sucedidos recentemente na Série B, porém não deram certo. 

Até Felipão - ultrapassado, mas campeão nacional não faz nem 3 anos - não conseguiu melhorar significativamente o time, ainda que tenha sido o melhor entre os técnicos que passaram pela Toca da Raposa em 2020.

A coisa se complica diante da nova regra imposta: só pode trocar de treinador uma única vez. Ou seja, Mozart é a última bala do Cruzeiro. Se o tiro for desperdiçado, terá que ficar com o técnico interino até o fim do Brasileirão.

É possível identificar um paradigma nas escolhas de Sérgio Rodrigues, o presidente (infelizmente). O critério não é incorreto, a meu ver, mas desconsidera as especificidades de uma instituição de futebol. Ele supostamente se baseia no rendimento para contratar. Trouxe o rejeitado Rodrigo Pastana para o cargo de Diretor Executivo de Futebol - apesar do histórico de conduta bastante questionável desse cidadão -, porque ele seria "especialista em acessos". Esse  trabalhou com Mozart no Coritiba e na boa e quase bem-sucedida campanha do CSA na Série B passada. 

Antes, o Cruzeiro trouxe Enderson e Ney, justamente porque, como já sabemos, tinham conseguido acessos com outros times. Sérgio age como um empresário olhando currículos e escolhendo aqueles que indicam experiências recentes e de sucesso, ao mesmo tempo em que se adequam à realidade do clube. Não é má a ideia (que ele executa de forma desastrosa). Só que empresa privada é uma coisa, clube de futebol, associação civil, é outra.

Ainda que no comando esteja alguém com boa experiência e currículo respeitável, como Felipão, isso não é garantia de sucesso em qualquer desafio no futebol - até aquele relativamente menos complicado. Mesmo que tentem tornar esse esporte o mais científico, exato e racional possível. E quando se escolhe profissionais com currículos medíocres, a probabilidade de dar certo obviamente reduz. O futebol envolve inúmeras variáveis, algumas sob controle, outras não; algumas conhecidas, outras nem tanto. Dentro e fora das quatro linhas. 

Os clubes costumam lidar com variáveis gerais, aquelas que são comuns, mas há as específicas que mudam conforme a instituição. Ney Franco deu certo com o Goiás na Série B. No Esmeraldino, ele lidou com certas variáveis. Fracassou no Cruzeiro, trabalho em que já envolvia algumas outras muito distintas. Mozart, como já dito, quase alcançou a Série A com o CSA, todavia não rendeu treinando a Chapecoense. No time alagoano, as variáveis formavam uma coisa; em Santa Catarina, outra. No Cruzeiro, será também diferente. 

Quando o clube está emocional e financeiramente instável, a situação naturalmente piora ainda mais. O dinheiro ajuda a manter determinadas variáveis sob controle, assim como o ambiente tranquilo para trabalhar. 

O ideal seria buscar um treinador que se enquadre em um padrão bastante específico. Contudo, é improvável. O imbróglio do Cruzeiro parece ser algo nunca visto antes, ao menos por aqui. É resultado de uma destruição gradativa que dura anos, começando silenciosa e depois estourando na cara de todos, e que culminou nessa situação.

Resta reforçar o time e criar a melhor condição possível de trabalho para o próximo treinador. Cruzeiro continua sendo uma incógnita em 2021.

Roni Pereira, jornalista residente em Salvador/BA

Nenhum comentário:

Postar um comentário

A Cartomante

Eram 22 horas. No bar Antipelego, a conversa regada a cerveja e a cachaça era comandada por trabalhadores da construção civil. Depois de dez...